Road to Euro 1984 (parte IV)
... e chegamos ao Domingo de Novembro para o qual estava marcada a tal 'final', contra a URSS, que Portugal estava obrigado a vencer, de modo a obter o 'passaporte' para França.
Tal como nos jogos anteriores, o meu tio iria levar-me à Catedral da Luz (sem dúvida o estádio mais apropriado para um jogo desta importância), para assisti-lo ao vivo. E desta vez, também iria com um primo meu, que é sensivelmente da mesma idade que eu e um dos meus grandes amigos de infância (não obstante o defeito de estar convencido ser sportinguista, algo que ainda se mantem nos dias de hoje...), pelo que o entusiasmo era ainda maior. O jogo estava marcado, se não estou em erro, para as 15h00.
Mas chegado ao dito dia, e ao acordar, constatei que chovia torrencialmente, o que comprometia a possibilidade de ir à Luz... Estava desolado, mas não conformado...
A todo o momento ia à janela verificar se a chuva já tinha parado, quase com a convicção de que isso faria a chuva parar! O que é certo é que por volta da hora do almoço a chuva parou... E mais ainda, o Sol começava a, timidamente, aparecer, dando a entender que pretendia participar naquela tarde de futebol e iluminar, ainda que levemente, a exibição dos jogadores portugueses, bem mais habituados ao Sol que os soviéticos.
E assim sendo, e assim que terminou o almoço, o meu tio lá levou nos levou para o estádio.
Passada a ansiedade relativamente às condições climatéricas, começava então a pensar, no caminho para o estádio, sobre as dificuldades que seriam de esperar.
O resultado da primeira volta era inequívoco acerca da qualidade do adversário: a tal derrota por 0-5 em Moscovo. A equipa soviética, cuja base era formada por jogadores do Dínamo Kiev, era vista como uma espécie de "máquina de jogar à bola", pois os movimentos estavam de tal forma mecanizados que dizia-se que os jogadores faziam os passes sem olhar, pois se o fizessem para determinado sítio, sabiam que iriam encontrar um colega de equipa para o receber. Dessa equipa, recordo-me de alguns jogadores (não sei se terão jogado na Luz): Dasaev (claro! um dos melhores guarda-redes de sempre), Blokhin (a estrela da companhia e o mais perigoso jogador do ataque soviético), Demianenko, Bessonov, Gavrilov e Bal. O treinador era o mítico Valery Lobanovsky, que acumulava funções com a de treinador do Dínamo Kiev.
Tinha consciência que para ganhar o jogo, Portugal iria necessitar de um momento de inspiração de Chalana ou Carlos Manuel e do sentido de oportunidade de Gomes e Jordão, pois não era previsível que ocorressem muitas situações de golo.
O jogo finalmente começou, e a toada foi a esperada: Portugal mais ofensivo, mas a URSS a controlar bem os acontecimentos. Não era fácil para Portugal criar oportunidades de golo, mas em compensação, os soviéticos também não pareciam muito preocupados em explorar o contra-ataque (até porque Portugal também não estava a arriscar "à maluca", sabendo desse potencial perigo).
A acabar a primeira parte, o tal momento decisivo surgiu: Chalana 'pegou' na bola, e tentou, bem à sua maneira, tirar partido dos seus dotes técnicos e "furar" a defesa soviética em jogada individual. Sobre a linha da grande área, Chalana cai...Fora ou dentro? Rasteira ou 'mergulho'? No estádio fiquei com a sensação que havia sido dentro da área, mas que Chalana havia "forçado" a queda... Mais tarde, as imagens televisivas demontravam precisamente o contrário: Chalana é, de facto, rasteirado, mesmo no limite da área, mas no exterior da mesma... Em todo o caso, o árbitro marcou penalty. E não me recordo de os jogadores soviéticos protestarem muito... possivelmente era algo que, por força das circunstâncias políticas da época, se tinham habituado a não fazer...
E lá estava a tal oportunidade única: dificilmente Portugal voltaria a ter uma oportunidade tão flagrante para marcar. A responsabilidade recaiu sobre Jordão... Eu estava ansioso, mas também confiante, pois sabia que nestas alturas, Jordão era praticamente infalível, ainda que entre os postes estivesse aquele que seria, possivelmente, o melhor guarda-redes do mundo: Rinat Dasaev.
Felizmente, Jordão manteve a frieza e conseguiu "enganar" Dasaev, remantando para a esquerda deste, que, por sua vez, se lançou para a direita. GOLO!!!!!!!
A primeira parte terminou pouco tempo depois.
Para a segunda parte eu esperava uma URSS fortemente pressionante. Mas não tenho a ideia de isso ter acontecido. Tudo o que me recordo foi de um remate às malhas laterais da baliza de Bento, que no momento deu a sensação de golo (e um arrepio na 'espinha'). Tirando esse lance, não me recordo de a baliza portuguesa ter sido fortemente ameaçada, mas também não me recordo de Portugal ter estado perto de ampliar a vantagem.
Saí do estádio com uma sensação de orgulho, pois um país pequeno como Portugal (mas ainda assim, com grande jogadores e, como tinha acabado de provar, também como uma grande equipa, sabendo que a primeira nem sempre implica a segunda...), tinha acabado de se apurar para o campeonato da europa, numa altura em que apenas 8 equipas se qualificavam, ainda para mais, em detrimento de uma das selecções mais poderosas da altura: a URSS.
Já estava ansioso pela fase final do europeu, mas ainda havia muito tempo até lá, pelo que sempre podia "concentrar-me" no meu Benfica...
11 Comments:
Não estive lá, mas recordo-me de ouvir o relato.
Tenho esse jogo gravado em video. Gravei-o da RTP Memória há uns meses atrás.
Não vem a propósito, mas só agora tive oportunidade de ler alguns posts mais antigos deste blog, numa pesquisa aos arquivos.
O dos Cadernos da Bola fez-me recordar coisas incríveis como obrigar o meu pai a reservá-los em duas tabacarias diferentes para o caso de nalguma delas falhar (pois houve um ano em que deixei esgotá-los e depois foi um sofrimento...).
O do Subbuteo também me lembrou dos campeonatos que fazia no meu quarto. Tal como um comentador disse, também eu susbtitui os bonecos por caricas, de modo a escrever o número e o nome, fazendo assim várias equipas.
As caricas foram aliás para mim uma verdadeira tara até aos 12 anos.
Fazia voltas a França em bicicleta, maratonas, grandes prémios de F1, campeonatos de futebol, e até coisas estranhas como ténis ou boxe (o ténis com três linhas enroladas a servir de rede, tendo o berlinde que passar sem sair das marcações, também a linha na alcatifa, e o Boxe atirando uma carica contra a outra dentro de uma tampa de skip, até que uma se virasse ao contrário, contando assim os pontos ). Cheguei a fazer também natação dentro de um alguidar.
Tinha milhares de caricas.
A propósito de subbuteo, gostaria já agora de saber se alguém tem ou conhece alguem que tenha, um jogo de "hoquei em patins" também dessa altura.
Eu tive-o, mas não sei como desapareceu e estava interessado em comprá-lo para o meu filho.
LF, obrigado por partilhares as tuas memórias, ainda que não directamente relacionadas com o post, mas ainda assim relacionadas com o blog (peço desculpa pelo abuso de estar a tratar-te por "tu", mas acho que determinado tipo de "cerimónias" às vezes atrapalha mais do que ajuda!).
Eu nunca me entusiasmei pelas caricas como alternativa ao subbuteo. Usava-as mais para corridas com os meus colegas.
Qto ao jogo do "hóquei em patins", lembro-me que um dos meus colegas de primária tinha um, mas já perdemos o contacto há muito...
Relativamente ao subbuteo já posso ajudar, pois ainda recentemente comprei várias equipas (um gajo nunca cresce!!), na esperança de entusiasmar os meus filhos a jogar...
Ainda assim, sugiro o ebay, talvez encontres por lá qq coisa...
Boas memórias. Lembro-me dessa tarde inesquecível de ter ouvido o relato na rádio.
E aquele penalti... A jogada do Chalana é excelente, mas ele caiu bem antes da área.
Quanto ao Dassaev, é o melhor Guarda-redes que já vi actuar.
Um abraço!
Francis, se não me engano, o Chalana até caíu dentro da área, mas a falta é que foi fora.
Mas artista como o Chalana era, conseguiu iludir bem o árbitro e fazê-lo crer que foi penalty.
Mas mesmo que tivesse sido assinalado livre directo, tenho a certeza que o Carlos Manuel teria marcado na respectiva cobrança :-)
... e também para mim o Dasaev é o melhor GR que alguma vez vi jogar.
Obrigado pela dica.
O interesse é mesmo no do Hóquei, pois jogos de futebol existem vários no mercado enquanto de Hóquei nunca vi mais nenhum, embora reconheça a singularidade do subbuteo.
NOTA: Obviamente que não me importo nada com o tratamento por "tu", antes pelo contrário.
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Também fui ver este jogo. Fui para o lugar habitual do meu pai, no sector dos cativos, e curiosamente fomos com o filho de um colega dele que também era lagarto. No estádio deu-me a nítida sensação que era falta e que tinha sido dentro da área, mas verificou-se depois na TV que tinha sido feita fora. Só que como as marcações estavam pouco visíveis graças à chuva, o árbitro pode ter-se confundido. No entanto, lembro-me que ganhámos merecidamente. O Diamantino até atirou um livre à barra na 2ª parte.
P.S. - Ainda bem que estás de volta e a todo o vapor! :-)
S.L.B., não me lembro desse livre à barra do Diamantino...
Mas já me lembro (sobretudo agora que o referiste) da questão das marcações esbatidas. O certo é que, na altura, também fiquei com a ilusão de ter sido dentro da área (ainda que com dúvidas acerca da existência da falta, como já referi).
Grande Blogue!!
Parabéns.
Por acaso ontem também recordei este jogo contra a URSS no meu blogue:
http://encarnado-e-branco.blogspot.com/2006/11/na-luz-h-23-anos.html
Boas a todos!
Sei que o Post é muito antigo, mas mesmo assim resolvi deixar aqui uma questão que me inquieta. Eu sou de 87, não vi o euro de 84, mas fui bombardeado pelas historias do meu pai, de maneira que fiquei bastante agarrado a esta campanha historica dos Lusitanos de Bigode. Uma das hitorias, que me contou, é uma espécide de conspiração. Diz-me ele que enquanto faziamos o jogo da meia final, frente à frente e estávamos na frente por 1-2, a transmissão televisiva parou por momentos. E daí a instantes levamos 2, e fomos eliminados. Por termos muitos emigrantes em França, achou-se uma afronta aos franceses, serem eliminados por nós, e a somar a isto Portugal não pertencia à CEE, o que fazia de nós pequeninos.
Enviar um comentário
<< Home