Taça dos Campeões Europeus 1983/84 (parte II)
Como referi no anterior post sobre este assunto, calhou em sorte (ou azar) ao Benfica defrontar o poderoso Liverpool nos 1/4 de final desta edição da TCE.
Nesta equipa do Liverpool alinhavam alguns jogadores de relevo internacional (o guarda-redes zimbabuano Bruce Grobelaar, o irlandês Ronnie Whelan, os escoceses Kenny Dalglish e o nosso bem conhecido Graeme Souness e, claro, o incontornável goleador galês, Ian Rush).
Mas mais do que as individualidades (onde a veia goleadora de Ian Rush era sem dúvida um factor diferenciador), o Liverpool valia sobretudo pelo conjunto.
1ª "mão"
Ditou também o sorteio que o 1º jogo fosse na "cidade dos Beatles", no mítico Anfield Road.
Acompanhei o relato pelo rádio e a recordação que tenho foi de um jogo em que o Liverpool, jogando em casa, procurou sobretudo explorar, como típica equipa inglesa, o jogo aéreo, no qual Ian Rush era muito forte.
O Benfica tentava, acima de tudo, contrariar o caudal ofensivo do Liverpool, mas mesmo assim não conseguiu evitar que, a meio da segunda parte, o inevitável Ian Rush marcasse de cabeça em resposta a um centro no qual ficou a sensação que Bento poderia ter feito algo mais... Mais tarde, Bento justificou que foi encadeado pelos holofotes do estádio, e por isso, não pode seguir a trajectória da bola...
1-0 seria o resultado final. Apesar da derrota, a diferença mínima permitia ao Benfica ainda assim acalentar alguma esperança de, 15 dias depois, na Luz, "dar a volta" à eliminatória.
2ª mão
Este jogo foi transmitido pela RTP, o que não era muito comum, por isso, a minha expectativa era ainda maior. Afinal, íamos jogar contra uma das melhores equipas do mundo, mas por outro lado, o Benfica tinha uma das melhores equipas de que tenho memória (e que ainda no ano anterior tinha feito uma excelente campanha na Taça UEFA).
Só que o início do jogo foi bastante infeliz... Ainda não estavam decorrido 10 minutos, há um canto a favor do Liverpool. A bola sobra para Whelan, que perto da marca de penalty, cabeceia com pouca força na direcção de Bento. A bola ainda toca no chão e Bento, inexplicavelmente, deixa-a escapar por entre as pernas, acabando a bola por entrar na baliza. Em suma, um enorme "frango"... Aquilo não foi um balde de água fria, foi um enorme alguidar de gelo...
Como é evidente, a equipa acusou este golo extremamente infeliz. Tentou reagir e tomar a iniciativa de ataque, mas o Liverpool nunca deu grandes espaços para o Benfica criar perigo.
Com o Benfica balanceado para o ataque, o Liverpool tinha mais espaço para contra-atacar. De tal forma que, ainda com menos de metade da 1ª parte decorrida, o australiano Johnston faz o 0-2... O Benfica passava a precisar de marcar 4 golos para seguir em frente, ainda para mais contra o poderoso Liverpool. Ou seja, aquele golo praticamente resolvia a eliminatória.
Mas mesmo sabendo que a eliminatória estava praticamente resolvida, não quis deixar de ver o resto do jogo.
Por um lado, o Liverpool apenas tinha que se limitar a gerir a vantagem, por outro, o Benfica queria, pelo menos, deixar uma boa imagem e alcançar o golo. Golo esse que acabou mesmo por acontecer aos 75 minutos: lançamento longo para a entrada da área do Liverpool e Nené, aproveitando o adiantamento de Grobelaar, cabeçeou a bola em arco, marcando um golo bastante bonito. Esse golo pouco adiantava em termos de eliminatória, pois já não faltava muito para o jogo terminar, mas deu novo alento ao Benfica para procurar, pelo menos, o empate.
Só que enquanto o Benfica tentava chegar ao empate, o Liverpool voltou a aproveitar os espaços concedidos, e nos últimos 10 minutos de jogo, fez mais dois golos (pelo inevitável Rush e com Whelan a bisar), tornando a derrota bastante pesada...
Se, por um lado, perder com Liverpool não era nenhum "escândalo", visto tratar-se de uma das melhores equipas do mundo, à época, perder por 1-4 já era bastante mais difícil de digerir...
Como não podia deixar de ser, nos dias que se seguiram tive de ouvir as inevitáveis piadinhas de lagartos a sugerir que eu ainda ia tempo de mudar de clube (tinha 11 anos na altura) e outras parvoíces do género.
Mas ainda que esta derrota tenha sido pesada e difícil de digerir, o Benfica não se deixou abalar pela mesma. À data desta derrota, o Benfica liderava o campeonato, e apesar da forte concorrência do FCP e de um "deslize" ou outro, o Benfica manteve a liderança até ao fim e sagrou-se, muito justamente, Campeão Nacional (tal como já recordei em posts anteriores).